domingo, 19 de outubro de 2008

20 Anos de Constituição e a Política Pública

Jornal do Commercio - Direito & Justiça - 17, 18 e 19.10.08 - B-7
20 Anos da Constituição e a política pública
São Paulo, 6 de outubro de 2008 - A Constituição Federal Brasileira comemora 20 anos em outubro deste ano. Promulgada após duas décadas de ditadura militar, a Constituição de 88 é considerada a mais democrática de todas as constituições brasileiras. Isso porque, pela primeira vez na história constitucional do Brasil, os direitos sociais foram expandidos e consagrados como direitos fundamentais.

Já no preâmbulo é previsto o objetivo da nova Constituição: “assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos”.

Deste modo, é dever do Estado e direito de todos os cidadãos - em especial dos que precisam de maior amparo -, o acesso à saúde, educação, cultura, desporto, assistência social, entre outros direitos. Apesar da prestação dos serviços essenciais ter um caráter obrigatório para o Estado, não foi afastada a possibilidade de organizações privadas, com ou sem fins lucrativos, atuarem nessas áreas. Ao contrário, o legislador quis incentivar a participação principalmente de entidades sem fins lucrativos na prestação de serviços públicos, não apenas por meio de incentivos fiscais, como também pela possibilidade de o Poder Público realizar parcerias com essas organizações com vistas a fomentar suas atividades.

A Constituição Federal, em diversos de seus dispositivos, deixa claro o entendimento de que a formulação e execução de políticas públicas não é uma tarefa apenas de governos, mas deve incluir a participação da comunidade. Trata-se de um princípio recorrente em todos os capítulos da ordem social da Carta.

Vejamos, por exemplo, o que ocorre no campo da saúde, em que o texto constitucional insere a “participação da comunidade” como diretriz do Sistema Único de Saúde (art. 198, III), nele permitindo, expressamente, a participação das “entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos” (art. 199, § 1º); da assistência social, onde é assegurado o envolvimento de “entidades beneficentes e de assistência social” na coordenação e execução de programas (art. 204, I), sem falar na garantia de “participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis” (art. 204, II); ou da educação, em que parte dos recursos públicos pode ser dirigida a “escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas” (art. 213).

Diante disso, a criação de associações não apenas é incentivada, como constitui um direito. De fato, a liberdade de associação, prevista no artigo 5º, é um dos importantes direitos garantidos pela Constituição de 88 e significa que não apenas é plena a liberdade das pessoas associarem-se para fins lícitos, como também que é vedado ao Estado interferir no funcionamento das associações. Nesse sentido, qualquer interferência do Estado, direta ou indiretamente, será inconstitucional.

Contudo, a simples existência da Constituição Federal, no entanto, não é suficiente para assegurar que os direitos previstos sejam efetivamente respeitados. Para isso, é fundamental a participação de toda a população na formulação de políticas públicas e no controle das ações governamentais. É necessário que os direitos sejam exercidos, para que se alcance o objetivo da Carta Magna, que é proporcionar bem-estar e justiça social.

Afinal, não obstante todos os aperfeiçoamentos e os esforços despendidos na modernização, principalmente no Poder Judiciário, o verdadeiro acesso de grande parte dos cidadãos brasileiros aos seus direitos somente será concretizado por meio de políticas públicas que sejam implementadas com foco na superação da desigualdade e da exclusão social.

(Rubens Naves é sócio fundador do escritório Rubens Naves – Santos Jr. Hesketh Escritórios Associados de Advocacia. Professor licenciado da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade de São Paulo – PUC/SP, onde exerceu a chefia do Departamento de Teoria Geral do Direito – rn@ranves.com.br)

(Valéria Trezza é sócia do escritório Rubens Naves – Santos Jr. Hesketh Escritórios Associados de Advocacia – vmt@rnaves.com.br)

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