terça-feira, 22 de agosto de 2017

Questões societárias e fiscalizatórias na Terceirização

Com o título “Aspectos societários da Lei da Terceirização” foi publicado hoje no Valor, na principal coluna jurídica do país em jornal impresso, artigo levantando temas como impropriedade do capital social para medir a robustez financeira das empresas (devendo ser substituído pelo patrimônio líquido), limites mínimos de capital quando se tratar de Eireli (já que o Cód. Civil prevê para ela 100 s.m.) e quem fiscalizaria esse capital mínimo, se Junta Comercial ou Fiscalização do Trabalho.

De minha parte, entendo pela minha experiência como Vogal da Junta Comercial do RJ que as Juntas Comerciais não exercem função fiscalizadora, mas apenas de registro e de controle formal dos documentos a elas submetidos. Isto está mais do que consagrado. E não é incomum as Juntas falharem na verificação do capital social mínimo para a constituição de Eireli.

A fiscalização, em cada caso (critério empírico) ficará mesmo a cargo do Ministério do Trabalho, que diante do descumprimento dos requisitos formais, exigidos para afastar o comando geral de contratação direta, desprezará a terceirização e autuará a tomadora ou cliente pela falta de registro do empregado.

Confiram.


Valor Econômico – Legislação & Tributos – 22.08.2017 – p.  E2

Aspectos societários da Lei da Terceirização

Por Gustavo Pires Ribeiro e Lígia Pedri Ferreira

Chamada de Lei da Terceirização, a recém-sancionada Lei 13.429, de 31 de março de 2017, traz inovações no âmbito do direito do trabalho e reforma a Lei 6.019/1974, alterando e incluindo artigos que tratam do trabalho temporário e da terceirização de atividades. Entretanto, alguns aspectos societários da nova lei são relevantes e merecem ser comentados. A nova lei remodela os conceitos de empresa de trabalho temporário e de empresa tomadora de serviços, assim como traz uma nova definição da empresa prestadora de serviços a terceiros, diferente do que era estabelecido em Instrução Normativa do Ministério do Trabalho sancionada em 1997. Ao analisarmos os aspectos societários da nova legislação verificamos que a referida lei prevê exigências em relação ao capital social das sociedades envolvidas na realização das atividades em questão. Para as empresas de trabalho temporário, a lei anterior exigia que o capital social fosse, no mínimo, 500 vezes o valor do maior salário mínimo vigente no país. Agora, esse mínimo passou para o montante de R$ 100 mil, ou seja, houve uma diminuição substancial do montante exigido. A exigência de valores mínimos de capital social não é a forma mais apropriada de proteger direitos de credores e empregados Para as empresas envolvidas na terceirização de mão de obra o valor do capital social exigido varia a depender do número de empregados que a empresa tem, variando de R$ 10 mil a R$ 250 mil. Ainda sobre a questão do capital social, cabe lembramos que em artigo do Código Civil existe a previsão de capital social mínimo integralizado das Empresas Individuais de Responsabilidade Limitada (Eireli), que deve ser de valor superior a 100 vezes o maior salário mínimo vigente no país. Sendo assim, surge um ponto obscuro a ser esclarecido: a empresa Eireli que tiver em seu objeto social as atividades de trabalho temporário deverá observar o disposto no Código Civil ou a exigência contida na Lei 13.429/17? A mesma divergência existe em relação ao escalonamento do capital social da empresa prestadora de serviços de terceirização de mão-de-obra, considerando as faixas de capital mínimo estabelecidas na lei. Vale pontuar que a exigência de valores mínimos de capital social não é, no nosso entendimento, a forma mais apropriada de proteger os direitos de credores e empregados envolvidos na prestação dos serviços regulamentados pela legislação em comento, se este foi o intuito do legislador, dado que o valor do capital social diz respeito tão somente ao montante que foi aportado pelos sócios na empresa, não representando efetiva disponibilidade de recursos (caixa) para fazer frente às obrigações assumidas pela empresa perante seus colaboradores e terceiros. Uma forma mais apropriada de proteger tais direitos seria a nova lei ter exigido um valor mínimo de patrimônio líquido, ou um intervalo mínimo de valores referente a esta conta patrimonial, que é apontada no balanço anual da sociedade, alternativa que possibilitaria verificar com maior segurança a capacidade da empresa de honrar os seus compromissos, dado que o patrimônio líquido reflete com maior precisão a efetiva situação econômica da sociedade. Outro ponto que carece de esclarecimento é o momento que deve ocorrer a integralização do capital social exigido, dado que a nova lei não deixa expresso se o pagamento deve ocorrer no ato de constituição, e quando as empresas já constituídas deverão ter o capital social integralizado observando as novas exigências. Além desses questionamentos iniciais, vale indagar: a quem caberá fiscalizar essa exigência quanto ao valor de capital social? De acordo com a nova lei, a fiscalização seria feita pelo Ministério do Trabalho, nos termos do artigo 626 da Consolidação das Leis do Trabalho, mas não há dúvidas de que as Juntas Comerciais terão que desempenhar algum papel na observação desses requisitos, ao protocolarem o registro de empresas ou suas alterações. Todavia, fica a dúvida sobre o poder de fiscalização das Juntas Comerciais (órgãos de registro do comércio), pois até o momento o Departamento de Registro Empresarial e Integração (Drei), a quem compete estabelecer as diretrizes e coordenar as ações das Juntas Comerciais dos Estados, não se posicionou a respeito. Cabe a reflexão, ainda, sobre quais seriam os efeitos na esfera societária do descumprimento do capital social mínimo exigido pela Lei 13.429/17, considerando que em seu texto há apenas a previsão de pagamento de multa. Poderia a sociedade infratora ser considerada irregular, tornando os seus sócios ilimitadamente responsáveis pelas obrigações sociais? Embora entendamos que não há previsão legal permitindo tal interpretação, esta seria a consequência jurídica mais eficaz para assegurar a efetividade da nova lei, inibindo o seu descumprimento. Tratamos aqui de apenas alguns pontos que de início geram dúvidas no âmbito do direito societário, sem prejuízo dos demais questionamentos que dizem respeito ao direito do trabalho propriamente dito. A esperança é que em breve essas questões sejam esclarecidas para que as empresas possam ter mais segurança jurídica no desenvolvimento de suas atividades. Gustavo Pires Ribeiro e Lígia Pedri Ferreira são advogados da área comercial do escritório Marins Bertoldi Sociedade de Advogados