terça-feira, 26 de agosto de 2014

Medidas práticas para evitar excesso de jornada

Jornal Valor Econômico - 25.08.2014 Empresas adotam medidas para evitar exageros na jornada Por Emma Jacobs | Do Financial Times Grant Freeland começou a se preocupar com a quantidade de horas que dedica ao trabalho quando vários colegas talentosos de seu escritório em Boston pediram as contas. Eles estavam exaustos e desesperados para ter uma vida fora da empresa. Por um acaso feliz, ele foi contatado por Leslie Perlow, professora de liderança em comportamento organizacional da Harvard Business School. Ela tinha uma pergunta a que ele também queria responder: os consultores, que vivem à disposição das demandas de seus clientes, têm algo parecido com um equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional? Durante um ano ela estudou sua equipe no Boston Consulting Group (BCG) e chegou ao veredito de que o maior problema está na falta de previsibilidade. "As pessoas nunca conseguem fazer planos por conta das demandas dos clientes", afirma Freeland. Então, eles criaram um plano chamado "folga previsível", ou PTO [sigla em inglês para "predictable time off"]. Ela passou a conceder aos funcionários uma noite ou um dia entre as segundas-feiras e as quintas-feiras, quando eles não seriam contatados e poderiam desligar o telefone e o e-mail. "A maior parte dos esforços para equilibrar a vida pessoal com a vida profissional não dá certo se for superficial. É preciso mudar a maneira de trabalhar", diz Freeland, sócio sênior do BCG. "Foi complicado vender isso", reflete ele. "Alguns acharam que se tratava de um rito de passagem; outros diziam que não precisávamos da PTO", lembra. O aspecto mais importante da iniciativa, lançada em 2008, foi fazer as pessoas falarem e planejarem. Segundo Freeland, isso forçou as equipes a definir prioridades. "Constatamos que os grupos que tinham folgas previsíveis trabalhavam menos horas no geral, mas de maneira mais inteligente." A política também forçou as pessoas a discutir normas comportamentais. "Se você promove aqueles que trabalham 20 horas por dia, as pessoas acham que para conseguir uma promoção também precisam trabalhar 20 horas por dia", enfatiza. Entre as equipes que adotam a "folga previsível", a taxa de retenção tem aumentado. Freeland diz trabalhar em média 60 horas por semana. No entanto, sempre que vai atender um cliente, sabe que todas as possibilidades estão abertas. "As pessoas precisam se dedicar bastante", diz. Apesar da vontade do BCG de mudar suas práticas de trabalho, a reclamação mais comum no Glassdoor, um site que possibilita a ex-funcionários fazerem análises das companhias em que trabalharam e de seus cargos, é o excesso de trabalho. Um usuário escreveu: "Há uma cultura de se trabalhar em excesso profundamente enraizada. As sessões de PTO acabam se transformando em sessões de reclamações que não mudam as expectativas". Mesmo assim, o BCG pelo menos está enfrentando o problema, o que não é comum em um setor que valoriza muito as longas horas de trabalho. E a consultoria não está sozinha: muitos banqueiros, advogados e médicos veem o excesso de trabalho como um distintivo de honra. Alexandra Michel, que deixou o setor financeiro e virou acadêmica, constatou que, mesmo quando os banqueiros mudam para outras áreas em busca de um melhor equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional, acabam internalizando a antiga rotina a tal ponto que acabam aumentando a carga horária para os novos colegas. No setor de tecnologia, os codificadores trabalham sem parar. Além disso, o setor tem a propensão de preferir os jovens, diz Jim Hart, executivo-chefe da Senn Delaney, uma consultoria especializada em cultura organizacional. "Isso encoraja as pessoas a pensar que podem trabalhar duro enquanto estão aptas e jovens, para ganhar dinheiro." Há evidências de que o excesso de trabalho afeta a produtividade. Um estudo da Universidade Stanford mostrou, por exemplo, que aqueles que trabalham 60 horas por semana produzem menos códigos de qualidade do que aqueles que trabalham 40 horas. Mas outro estudo feito pela Graduate School of Management da Universidade da Califórnia em Davis mostra que, quanto mais uma pessoa é vista no escritório, mais os outros a percebem como "confiável" e "comprometida". "A maior parte dos esforços para equilibrar a vida pessoal com a vida profissional não dá certo se for superficial", diz Grant Freeland, do BCG A Universidade de Oxford, por sua vez, recentemente apresentou uma pesquisa na qual identifica o surgimento de uma nova superclasse trabalhadora de profissionais ricos que passa mais tempo no trabalho. O estudo diz que as pessoas mais instruídas costumavam trabalhar menos, mas no começo do século XXI elas estão trabalhando mais. Algumas companhias estão fazendo experiências, refreando o uso de tecnologias que tornam tênue a fronteira entre a vida profissional e a vida particular. A fabricante de automóveis alemã Volkswagen impede que e-mails sejam enviados de 30 minutos após o término do turno de um funcionário até que o servidor seja ligado no dia seguinte, voltando a emitir e-mails meia hora antes do começo do novo dia de trabalho. Recentemente a Daimler anunciou que seus funcionários poderão optar por ter automaticamente apagados todos os e-mails que eles receberem quando estiverem de férias. A doutora Alexandra Michel acredita que até mesmo os profissionais do setor financeiro podem conter o excesso de trabalho se seus patrões fornecerem provas de que suas habilidades como a capacidade de julgamento e a criatividade entram em declínio após muitas horas passadas dentro do escritório. "Muitas firmas entrevistam clientes informalmente sobre a criatividade nas soluções apresentadas por uma equipe. Esse resultado é repassado para os funcionários semanalmente e permite que eles façam uma correlação entre o excesso de trabalho e as dimensões que são críticas para o alto desempenho." Tal feedback, diz ela, é mais eficiente do que simplesmente dizer às pessoas o que pode acontecer quando elas trabalham demais, ou estabelecer regras contra o trabalho nos fins de semana. Almuth McDowall, uma psicóloga ocupacional especializada em qualidade de vida, diz que é possível mudar uma cultura. Ela está trabalhando com algumas companhias britânicas de tecnologia que atrelam as bonificações ao trabalho consciente. Se o profissional atinge sua meta dentro do tempo, ele é recompensado financeiramente - o que não acontece se ele trabalhar excessivamente. Ela acredita que não sabemos reconhecer "a aparência do bom trabalho, e ficar além do expediente acaba se tornando um sinônimo de bom desempenho". Alguns bancos vêm tentando coibir essa prática entre os funcionários menos graduados, indo além da concessão de dias de folga bem definidos. Eles também buscam maneiras para que esses funcionários mostrem suas habilidades e não sintam que só conseguirão provar seu valor se matando de trabalhar. Além disso, as tarefas precisam ser realistas e alocadas de maneira coerente. "Precisamos ver o dever de responsabilidade como parte da função do gestor", diz Almuth McDowall. "E as horas de trabalho razoáveis precisam ser defendidas pela média e pela alta gerências." Don Serratt, que deixou o setor bancário para abrir uma companhia que trata de problemas de saúde comportamental, diz que políticas gerais não funcionam. "É preciso começar com o indivíduo. Algumas pessoas têm mais resistência e conseguem energia trabalhando mais que os outros. Outras continuam trabalhando duro apesar das consequências negativas." Os sinais de alerta, diz ele, são acionados quando você está negligenciando sua saúde, deixando de ver seus filhos crescerem ou ignorando sua esposa. Um estudo do Google sobre as culturas de trabalho revelou que algumas pessoas têm mais facilidade do que outras para esquecer do trabalho no fim do dia. Laszlo Bock, que comanda o departamento de gestão de pessoas da companhia, descreve dois tipos de personalidade no trabalho: os "segmentadores", uma minoria capaz de traçar uma linha psicológica entre o estresse no trabalho e o lar, e os "integradores", para os quais o trabalho está sempre em suas mentes, levando-os a checar constantemente o e-mail. "No fim das contas, saber quando encerrar o dia é algo que vem da autopercepção", diz Serrat. (Tradução de Mário Zamarian)

LC 147 exclui psuedoempresas do Supersimples

Jornal Valor Econômico - 25.08.2014 Supersimples indica exclusão de falsas pessoas jurídicas Roberto Dumke SÃO PAULO Ainda em digestão pelos especialistas, a Lei Complementa 147/2014, que ampliou o Simples Nacional, traz uma ressalva para combater o aumento do número de empregados que atuam como falsas pessoas jurídicas. O mecanismo garante exclusão do regime simplificado a empresa cujo titular mantiver características de vínculo empregatício com o contratante do serviço. A medida deixa claro que o governo procura evitar que os empregadores e funcionários vejam na ampliação do Simples oportunidade para fugir dos encargos trabalhistas. Isso fica evidente no texto da nova lei, porque este exclui do Simples empresa cujo titular mantiver relação de pessoalidade, subordinação e habitualidade com o contratante. As três características são uma referência clara ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), segundo o especialista Daniel Cristofi, da consultoria Grounds. "Pessoalidade significa que outro não pode fazer o mesmo trabalho facilmente. Subordinação é acatar ordens, tarefas, metas, horário. Habitualidade é a frequência dos serviços." Ana Campos, também consultora da Grounds, afirma que o governo incluiu a ressalva pois já esperava que a ampliação do Simples Nacional pudesse resultar no aumento do número de pessoas jurídicas, em prática conhecida para fugir dos impostos. Entre as atividades que poderão integrar o regime tributário simplificado estão: médicos, dentistas, psicólogos, arquitetos, engenheiros, advogados, consultores empresariais, publicitários e também jornalistas. Hoje, diz Ana Campos, já há um estímulo tributário para que o empresariado tente contornar, de forma ilegal, a CLT via contratação de falsas pessoas jurídicas. Mas com a ampliação do Simples, a partir de 2015, este estímulo tributário fica ainda maior. Atualmente, uma pequena empresa de consultoria, por exemplo, paga quase 20% de impostos sobre o faturamento. No regime simplificado, as alíquotas variam de 14% a 17%. A interpretação de Marcelo Diniz, sócio-fundador do LCDiniz & Advogados Associados, a respeito do inciso 11 do quarto artigo da nova lei, com as três características que remetem à CLT, é a mesma. "O objetivo é evitar que este tipo de conduta. É um mecanismo antifraude." Segundo ele, a regra diz uma coisa que deveria ser óbvia. "Não se pode em nenhuma situação que o funcionário abra uma pessoa jurídica, mas continue naquelas situações de subordinação, pessoalidade e habitualidade", afirma. "Quando vem uma lei nova, isso causa impacto. Parece que a partir da lei não será mais possível contratar pessoas jurídicas. Mas na verdade nunca pode." Segundo Diniz, se há indícios de fraude, além dos tributos não pagos nos últimos cinco anos, a empresa pode ter que arcar com uma multa de 150% sobre o valor, além de processo criminal. E caso o fiscal entenda que há acordo entre empregador e empregado, ambos podem ser punidos. Facilidades Além de universalizar o Simples Nacional, a Lei Complementar 147/2014 trouxe um pequeno pacote de novidades para o empresariado. Uma das alterações na lei deve trazer facilidades de crédito para pequenas empresas. A mudança proíbe que as grandes restrinjam as menores de negociarem adiantamentos com terceiros por serviços ou mercadorias. Para receber o pagamento antecipado, as microempresas oferecem a bancos (ou outros agentes) notas já faturadas, em troca de crédito. Contudo, essa troca de credores às vezes trazia problemas para as grandes empresas. Em alguns casos, as empresas de menor porte negociavam a mesma nota com vários agentes financeiros, deixando a contratante numa situação delicada. Para evitar esse tipo de problemas, as empresas incluíam nos contratos cláusulas que proibiam a prática. A consequência disto, por outro lado, é que as pequenas empresas de boa fé ficavam com limitações de crédito. Com a mudança de lei, as grandes empresas precisarão usar outros mecanismos - não a proibição - para se proteger das fraudes. Na visão de Paulo Yamaguchi, do escritório Tess Advogados, as pequenas não perderão contratos. "Acredito que a regra não vai ser um impeditivo para contratar. A grande empresa tem como se precaver." Dispensa de certidões Outra novidade da lei é a dispensa da apresentação das certidões negativas de débitos tributários, trabalhistas e previdenciários para a baixa das sociedades. Seria um avanço, pois reduz o prazo para se encerrar uma empresa. Segundo Yamaguchi, a lei estabelece expressamente a responsabilidade solidária dos sócios e do administrador pelos débitos remanescentes, caso a baixa se realize sem as certidões negativas. O procedimento não impede cobrança posterior ou lançamento de tributos e penas. Na sua essência, não muda em relação à prática adotada hoje pelo fisco, que inclui sócios, administradores e até procuradores das sócias estrangeiras, para recuperação dos créditos.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Contribuição assistencial

Notícias do TST – 20.08.2014. Falta de maioria absoluta impede TST de alterar jurisprudência sobre contribuição assistencial. Em sessão extraordinária realizada nesta terça-feira (19), o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho colocou em votação proposta de alteração da redação do Precedente Normativo 119 e o cancelamento da Orientação Jurisprudencial 17 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC), que tratam da contribuição para entidades sindicais. A proposta foi aceita por 12 votos, contra 11 votos contrários. O Regimento Interno do TST, porém, exige, para a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula ou de precedente normativo, a aprovação da maioria absoluta, ou seja, 14 votos. Por esse motivo, embora houvesse maioria a favor da mudança, o Pleno declarou, regimentalmente, a manutenção da redação atual do PN 119 e da vigência da OJ 17. Os dois verbetes consideram que a cobrança da chamada contribuição assistencial de trabalhadores não sindicalizados viola o direito constitucional à livre associação e sindicalização. Há anos as entidades sindicais vêm trazendo ao TST sua preocupação com este entendimento e defendendo a contribuição obrigatória, extensiva a todos os trabalhadores das categorias representadas pelos sindicatos. Sua principal alegação é que as negociações e acordos coletivos beneficiam a todos, independentemente de filiação. O tema foi encaminhado até mesmo à Organização Internacional do Trabalho (OIT). As centrais sindicais brasileiras apresentaram, em 2014, representação ao Conselho de Administração da OIT contra o TST e o Ministério Público do Trabalho, para que o organismo intervenha, como mediadora, para que o TST reveja sua jurisprudência. O ministro Levenhagen, que já se declarou favorável à alteração, tem recebido, desde que assumiu a Presidência do TST, em março, diversas manifestações das entidades sindicais e, por isso, tomou a iniciativa de encaminhar a proposta. "Foram inúmeras visitas de sindicalistas", afirmou Levenhagen. "Na última delas, há cerca de duas semanas, compareceram as cinco centrais sindicais". Regimento Interno O texto encaminhado à Comissão de Jurisprudência, subscrito por 14 dos 27 ministros do TST (atualmente 26, pois uma vaga aguarda nomeação), propunha que a redação do PN 119 fosse alterada para prever a extensão da contribuição sindical a não associados mediante acordo coletivo, tendo o trabalhador 20 dias para manifestar formalmente sua recusa. Quanto à OJ 17, a proposta era o cancelamento. O parecer da Comissão de Jurisprudência foi no sentido de cancelar os dois verbetes, "a fim de permitir à Corte reanalisar amplamente as questões referentes à contribuição assistencial, devendo o direito de oposição e a forma de cobrança serem consolidados em momento futuro, após a catalogação dos necessários precedentes, nos termos das normas regimentais". Na sessão de ontem, participaram 23 ministros. Como 12 votaram a favor da mudança e 11 contra, não houve maioria absoluta, como prevê o artigo 62, parágrafo 1º, inciso IV do Regimento Interno. Assim, embora tenha recebido adesão majoritária dos ministros, a proposta não pôde ser implementada. (Carmem Feijó)

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Regras de fiscalização do trabalho doméstico

Fonte: Migalhas Definidas regras de fiscalização das normas de proteção do trabalho doméstico Empregador que não respeitar legislação do trabalho doméstico será notificado. Foi publicada nesta quinta-feira, 7, no DOU, a IN 110/14, que dispõe sobre os procedimentos de fiscalização do cumprimento lei ordinária 12.964/14, que trata de multa por infração à legislação do trabalho doméstico. Se a fiscalização for iniciada por denúncias, a identidade do denunciante e qualquer informação dele será totalmente sigilosa. O empregador que for suspeito de descumprir as novas normas receberá uma notificação o convocando para comparecer em uma das unidades descentralizadas do MTE. A notificação será entregue por um auditor-fiscal do trabalho e no documento constará o dia, a hora e o local que deverá se encaminhar. O não atendimento à notificação acarretará a lavratura dos autos de infração cabíveis. Em observância ao mandamento constitucional da inviolabilidade do domicílio, o auditor-fiscal só poderá entrar na casa do empregador com seu consentimento. Em caso de impossibilidade de comparecimento, o empregador poderá ser representado por alguém da família que seja maior de dezoito anos, se a pessoa residir no local onde ocorrer a prestação de serviços pelo empregado doméstico. Carteira de trabalho Desde o dia 8 de agosto, os empregadores que não assinarem a carteira de trabalho dos empregados domésticos já estão passiveis de multas. O valor é estimado em cerca de R$ 805 e pode aumentar em caso de omissão do empregador sobre itens como a idade do empregado e tempo de serviço. Os benefícios como a jornada de 44 horas semanais e o adicional de horas extras, com valor pelo menos 50% superior ao normal, também já estão valendo. A ampliação dos direitos trabalhistas da categoria, como a jornada de trabalho de oito horas e o pagamento de horas extras, vem na esteira da PEC das Domésticas, que foi aprovada no ano passado.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Novos crimes relacionados à discriminação no trabalho

Jornal Valor Econômico – Legislação & Tributos (Rio) – 06.08.2014) – E2 Proteção penal de minorias e trabalho Proteção penal de minorias e trabalho Por Fabio Lobosco Silva Entrou em vigor, no início de junho, a Lei nº 12.984, de 2014, que criminaliza condutas discriminatórias em ambiente de trabalho praticadas em desfavor de portadores de HIV ou doentes de AIDS. De acordo com os incisos II a IV, do artigo 1º, aquele que negar emprego ou trabalho; exonerar ou demitir de cargo ou emprego ou então segregar em ambiente laboral o portador do vírus em razão de sua condição, poderá ser apenado com reclusão de um a quatro anos e multa. Tal inovação legislativa se coaduna com a tendência contemporânea de se utilizar o direito penal como ferramenta auxiliar para ações afirmativas perante o mercado de trabalho. Ela tem origem na conjugação das disposições democráticas da Constituição Federal de 1988 e do fortalecimento e quase naturalização do vigente modelo de produção, esboçado pela derrocada socialista e consolidado pelas políticas econômicas liberais da década de 90. Tais fatos compuseram uma sociedade global cada vez mais plural, desafiada em alocar dentro de uma única estrutura produtiva seus variados grupos de diferentes matizes ideológicos, políticos, etários e sexuais. Desse modo, a Lei nº 7.716, de 1989 (de combate ao preconceito), em seu artigo 3º, determinou como crime punível com reclusão de dois a cinco anos a conduta de impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da administração direta ou indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos, ou então obstar sua promoção funcional em razão de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Em campo privado (art. 4º), aplica-se igual pena para quem, com igual motivação, negar ou obstar emprego; impedir a ascensão funcional ou obstar outra forma de benefício profissional e proporcionar tratamento diferenciado em ambiente de trabalho, especialmente quanto ao salário. Tal dispositivo legal também sujeitará às penas de multa e de prestação de serviços à comunidade, incluindo atividades de promoção da igualdade racial, quem, em anúncios ou qualquer outra forma de recrutamento de trabalhadores, exigir aspectos de aparência próprios de raça ou etnia para emprego cujas atividades não justifiquem essas exigências. Em que pese a louvável iniciativa de proteção penal, tais delitos encontram algumas dificuldades práticas comuns A Lei nº 7.853, de 1989, de apoio aos deficientes, por sua vez, tipificou como crime punível com reclusão de um a quatro anos e multa a conduta de obstar, sem justa causa, o acesso de alguém a qualquer cargo público, por motivos derivados de deficiência, bem como a de negar à alguém, por igual razão, emprego ou trabalho. Já o Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2013), no artigo 100, apena com reclusão de seis meses a um ano e multa aquele que por motivo de idade obstar o acesso de alguém a qualquer cargo público ou negar emprego ou trabalho. Em que pese a louvável iniciativa de proteção penal conferida a estes grupos, tais delitos encontram algumas dificuldades práticas comuns. A primeira delas diz respeito à dificuldade probatória para configurar a materialidade do crime, pois os métodos de seleção e avaliação de candidatos e funcionários se valem dos mais variados diagnósticos, testes e fases, permitindo camuflar atitudes discriminatórias por meio de justificativas pseudotécnicas. A segunda diz respeito à determinação de autoria delitiva. Em prestígio ao caráter personalíssimo da responsabilização penal, quem poderá responder por tais crimes não é a empresa, mas sim determinada pessoa física, integrante da estrutura empresarial. Desse modo, são autores do crime aqueles que efetivamente praticam atos discriminatórios ou determinam sua prática, o que também nem sempre é fácil de averiguar dentro de grandes companhias. Tais constatações colocam em xeque a real efetividade de tais dispositivos no cumprimento dos objetivos a que se destinam. Por fim, por uma questão de coerência sistemática, seria prudente uma revisão das penas impostas aos crimes citados, visando sua uniformização, afinal de contas teria o legislador entendido que na seara do mercado de trabalho discriminar um idoso (reclusão de seis meses a um ano) é menos gravoso do que praticar idêntica conduta em face de um deficiente (reclusão de um a quatro anos e multa)? Ou ainda, seria preferível discriminar um portador do vírus HIV (reclusão de um ano a quatro anos) do que um negro (reclusão de dois anos a cinco anos)? Sem dúvidas resta latente a injustificável discrepância entre a valoração de tais condutas, demonstrando ou um risível ato de discriminação das diferentes práticas discriminatórias ou, é preferível acreditar, mais um exemplo da habitual desordem do processo legislativo penal pátrio. Fabio Lobosco Silva é especialista em direito penal empresarial do Trigueiro Fontes Advogados