quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Negociação para conter demissões

Valor Econômico - Brasil - 17.12.08 - A3

Sindicatos negociam para frear cortes
Cibelle Bouças, de São Paulo

Diante da onda de demissões ocorrida sobretudo nos setores de metalurgia, siderurgia e construção civil, sindicatos negociam com empresas alternativas para impedir mais cortes nos postos de trabalho, preservando ao máximo os direitos dos empregados. Adoção de férias coletivas e antecipação de férias, criação de banco de horas, flexibilização da jornada de trabalho e até suspensão temporária dos contratos de trabalho sem demissão são os principais mecanismos apresentados pelos sindicatos às empresas como forma de passar pelo período de crise internacional sem afetar o nível de emprego.
O principal objetivo dos sindicatos consultados pelo Valor é conseguir que as empresas desistam ou pelo menos adiem a decisão de demitir, pelo menos até janeiro, quando, acreditam, o pacote de ajudas oferecido pelo governo brasileiro terá produzido efeito sobre o consumo.
Em Manaus, as discussões já envolvem a suspensão temporária dos contratos de trabalho, informa o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Wilson Périco. Algumas empresas do pólo estão negociando essa possibilidade com os sindicatos, diz ele. Este recurso, observa o empresário, pode ser útil para atravessar um primeiro semestre fraco e manter os empregos até a segunda metade do ano, quando os economistas prevêem uma recuperação da economia brasileira.
Previsto na CLT, o mecanismo permite que as empresas suspendam os salários e encargos trabalhistas por um período máximo de cinco meses. Nesse intervalo, os trabalhadores recebem o seguro- desemprego. A contrapartida da empresa é oferecer aos operários cursos de capacitação. "É um a maneira de proteger os empregos e evitar custos", disse Périco. Para demitir, as empresas têm despesas significativas.
Em Osasco, o Sindicato dos Metalúrgicos fechou com três empresas de pequeno porte acordos para redução da jornada de trabalho com redução proporcional do salário, informou o presidente da entidade, Jorge Nazareno. O sindicato também negocia com a empresa Amsted-Maxion a demissão de 1.500 trabalhadores, sendo 200 em Cruzeiro, 600 em Hortolândia e 700 em Osasco. Na segunda-feira, a empresa demitiu 350 pessoas da unidade de Osasco, que possui 1.400 funcionários. "Estamos negociando com a empresa a adoção de outras medidas, como férias coletivas, criação de banco de horas."
O Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e Mogi das Cruzes também negociou redução de jornada com redução de salário com uma empresa. O presidente da entidade, Miguel Torres, afirma ter recebido várias consultas de empresas para negociar alternativas, principalmente no segmento de autopeças. A região possui 55 mil metalúrgicos, dos quais 16 mil estão em férias coletivas. Após as férias, os próximos mecanismos a serem discutidos com as empresas são uso do banco de horas e, no limiar, a suspensão temporária dos contratos de trabalho. "Ainda acreditamos que as empresas conseguem se manter nesse cenário por um ano sem precisar demitir. De 2002 a 2008, o setor de autopeças aumentou seu faturamento em 290%, existe gordura a ser cortada sem demissão", afirmou.
No ABC Paulista, quatro montadoras mantêm empregados 35 mil metalúrgicos, dos quais cerca de 90% estão em férias coletivas, mas já negociam medidas para reduzir os gastos com folha de pagamento. O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sérgio Nobre, mostra-se contrário às demissões, mas disposto a negociar medidas para preservar os postos de trabalho. "Na Alemanha, as empresas começam a falar em demissão depois de um ano e meio de crise. No Brasil, a crise nem se instalou e já querem demitir. Por enquanto, existem mecanismos que podem ajudar as empresas a atravessar esse período sem demitir, como a licença remunerada, o banco de horas e as férias coletivas. Vamos primeiro esgotar esses mecanismos", diz Nobre.
O Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos prefere negociar com as empresas férias coletivas e adoção do banco de horas. "O sindicato entende que é muito cedo para discutir redução de jornada ou outros mecanismos. É preciso esperar até fevereiro o efeito do pacote do governo federal", afirmou o coordenador do departamento jurídico do sindicato, Marcílio Penachioni. Em Guarulhos, o único caso de demissão em massa ocorreu na Valeo, que dispensou 204 pessoas. Outros 700 seriam demitidos, mas após negociação, a empresa concedeu férias coletivas.
Em Betim, o sindicato dos metalúrgicos também aposta em medidas mais convencionais, como férias e banco de horas, diz o presidente da entidade, Marcelino da Rocha. No fim de outubro, o sindicato reuniu-se com a Fiat e 13 autopeças, que pediram flexibilização dos direitos trabalhistas. "Falamos que não havia ambiente para discutir porque fechamos o acordo coletivo no dia 20 de outubro, com aumento real e garantia de emprego. Então fechamos um acordo para voltar a negociar na segunda quinzena de janeiro, após as férias coletivas", diz. Em Betim, duas empresas demitiram 200 pessoas.
O Sindicato dos Trabalhadores do Setor Plástico de Joinville fechou recentemente um acordo com as empresas para tentar evitar novas demissões, após 340 cortes em outubro. Segundo Reinaldo Schroeder, presidente do sindicato, foi acordado que as empresas fariam uso das férias vencidas e dessem férias individuais proporcionais, e adotariam banco de horas antes da decisão de demissão.
"A intenção era que as empresas esgotassem todas as alternativas antes de demitir". Schroeder afirma que em novembro o número de demissões diminuiu - em torno de 90. Muitas empresas, contudo, já anunciaram férias coletivas e em volume maior do que o tradicional. (Colaboraram Vanessa Jurgenfeld, de Florianópolis, e Raquel Landim, de São Paulo)

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