segunda-feira, 13 de julho de 2009

Negociação salarial de executivos em razão da crise

Trabalhista: Na crise, bancas atuam em poucas ações e muitos acordos Executivos renegociam salários para evitar litígios Laura Ignacio, de São Paulo 13/07/2009
Tramitam na Justiça trabalhista dezenas de ações de altos executivos brasileiros demitidos ou que pediram demissão em razão da crise atual. Os valores em discussão são altos - ao redor de R$ 1 milhão por processo -, mas os escritórios de advocacia que atuam na área têm sido mais demandados para evitar medidas como essa. Os advogados ficam incumbidos de repactuar contratos de profissionais que ainda trabalham nas companhias, frente à nova realidade econômica. Há casos, por exemplo, em que ficou impossível para a empresa alcançar os resultados milionários previstos antes da crise - e, consequentemente, cumprir as remunerações variáveis contratadas com seus executivos. Uma das saídas adotadas, nesses casos, é a renegociação de metas para fins de bonificação. Quanto às ações judiciais, ou ainda não há decisão ou foram firmados acordos homologados pelos juízes, dando fim às disputas.Os litígios envolvendo as bonificações de executivos decorrem do fato de que boa parte da remuneração desses profissionais é variável, composta por participação nos lucros, bônus semestrais por alcance de metas e "stock options" - opções de ações da companhia que o profissional pode comprar por preços abaixo do mercado -, ao passo que apenas uma pequena parte estabelece uma remuneração fixa, muitas vezes simbólica. Isso além de benefícios extras, que ficam de fora do contrato, como plano de saúde, escola para os filhos, seguro de vida, previdência privada e associação a clubes de lazer para a família. E é essa remuneração variável o foco das discussões atuais entre executivos e empresas - a grande maioria multinacionais.É o caso do vice-presidente de uma multinacional que atua na área de publicidade no Brasil e que foi dispensado por conta da crise. Ele resolveu ajuizar uma ação trabalhista contra a empresa alegando que deveria receber um montante maior de bônus. A empresa contestou argumentando que seu resultado havia ficado aquém do necessário para o pagamento do valor pedido pelo executivo. A ação ainda tramita na primeira instância da Justiça trabalhista e não houve decisão ainda. Apesar de existirem disputas judiciais, elas não são a maioria dos casos atendidos pelos escritórios de advocacia. Esse, por exemplo, é um dos poucos em que o advogado Estevão Mallet, advogado da banca Mallet Advogados Associados e professor da Universidade de São Paulo (USP) representa a empresa no Poder Judiciário. A maioria dos casos que chegaram ao escritório desde o início da crise envolve a renegociação de contratos. "São profissionais que ainda se encontram nas empresas, mas passaram a se sentir inseguros e nos procuram para saber quais direitos teriam na hipótese de uma dispensa e como poderiam negociar seu contrato", diz. Segundo o advogado, consultas como essas são feitas principalmente por executivos do mercado financeiro.De acordo com advogados, vários executivos de altos cargos, cuja parcela da renda variável corresponde a 80% do que recebem por mês, já aceitaram renegociar seus contratos para não serem demitidos. Das nove empresas que procuraram o escritório Lobo & De Rizzo Advogados com situação semelhante a essa, sete já alcançaram seu objetivo. "Sempre recomendamos o acordo porque estamos falando de executivos de primeira linha, que recebem valores astronômicos e, ao mesmo tempo, estão à frente das empresas", diz o advogado e sócio da banca, Valdo Cestari De Rizzo. Em uma das negociações concluídas, a parcela fixa do salário foi aumentada e a variável, reduzida. Nenhum caso em que a banca atua foi parar na Justiça - há dois com negociações ainda em andamento.O mesmo acontece em outros escritórios. Após receber diversas consultas de matrizes de multinacionais sobre a possibilidade de redução da remuneração de executivos - principalmente de empresas dos Estados Unidos, após a instituição da política de transparência salarial do presidente Barack Obama -, nenhuma ação foi ajuizada pela banca Mesquita Barros Advogados. "A jurisprudência brasileira é clara no sentido de que redução de salário por causa de situação econômica difícil só pode ocorrer com base em acordo coletivo", diz o advogado e sócio da banca Cássio de Mesquita Barros. Nos Estados Unidos, basta um acordo entre as partes diretamente envolvidas - o que permitiu a renegociação de contratos de diversos executivos no país desde o início da crise. E, apesar de, em geral, os contratos entre executivos brasileiros e multinacionais serem firmados no exterior, como o trabalho é realizado no Brasil, acabam sendo regidos por leis brasileiras, segundo a Súmula nº 207 do Tribunal Superior do Trabalho (TST).Um outro fator que inibe os litígios judiciais entre os executivos e as empresas é a recolocação no mercado. "A medida expõe a imagem da companhia, algo de que os próprios executivos não gostam porque, muitas vezes, são associados a elas", explica a advogada Nancy Tancsik, advogada da área de contencioso trabalhista do escritório Felsberg Advogados. Mas já há casos de acordos homologados pela primeira instância da Justiça do trabalho de São Paulo, com o apoio de advogados especialistas. Há duas semanas, por exemplo, o juiz da 86ª Vara do trabalho de São Paulo, Ricardo de Queiroz Telles Bellio, homologou dois acordos de executivos com multinacionais dos setores de bebidas e automobilístico, um deles de quase R$ 1 milhão. "Em ambos os processos, diretores que saíram da respectiva empresa por conta própria queriam negociar a manutenção de benefícios como a previdência privada", afirma o juiz. "Agora, esses executivos não podem mais tentar rediscutir seus direitos", diz.Nas ações pós-crise ajuizadas por executivos, ainda sem decisões, as motivações mais comuns são a redução ou corte de benefícios. Em um dos casos patrocinados pelo escritório Demarest & Almeida Advogados, o executivo recebeu um comunicado de sua empregadora reduzindo e cancelando benefícios a que tinha direito, tentou negociar com a empresa, mas suas propostas não foram aceitas e ele foi demitido. O escritório defende a empresa na ação trabalhista ajuizada pelo executivo. "Os valores envolvidos em cada ação judicial são altos, de R$ 1 milhão, no mínimo", afirma o advogado da banca, Geraldo Baraldi Júnior.Como ainda não há decisões nas ações em andamento, não se sabe qual será o desfecho dos litígios decorrentes da crise. Mas a jurisprudência atual é formada por decisões, inclusive do TST, no sentido de impor a reposição das perdas sofridas pelo empregado não só em relação ao salário, mas também a vantagens como os bônus semestrais. Segundo o advogado Ary Castelo, do escritório Lopes e Soares Advogados Associados, o resultado deverá ser o mesmo no contexto da crise.
Fonte: Valor Econômico - Legislação & Tributos - 13.07.09 - E1

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