segunda-feira, 16 de março de 2009

Trabalho informal como alternativa à crise

Valor Econômico - Finanças - 16.03.09 - C8

Trabalho informal, uma alternativa à crise?
Patrick Barta, The Wall Street Journal, de Ahmedabad, Índia
16/03/2009


Os economistas sempre acharam que a economia informal - o vasto e desregulamentado mercado que envolve de camelôs a motoristas de táxi sem licença - era um mau sinal para a economia mundial. Agora, a informalidade ganhou um novo papel como um dos últimos recursos em meio a uma economia cada vez pior, forçando os analistas a repensar esse ponto de vista.

Na feira Manek Chowk, no congestionado centro desta cidade indiana, camelôs instalados numa fileira de balcões carcomidos oferecem de feijões a panelas de cobre enquanto macacos fazem algazarra acima. Um homem afia pregos com um amolador conectado a uma roda de bicicleta.

A renda média em Manek Chowk é pífia se comparada aos padrões do mundo rico. Mas não há demissões na feira. As pessoas que trabalham aqui só precisam marcar presença e oferecer seus produtos - algo que mais e mais pessoas têm feito hoje em dia.

Sem esse trabalho, "não teríamos nada", diz Surajben Babubhai Patni, uma feirante de 58 anos que vende tomates, milho e nozes sob uma barraca de lona improvisada. Ela ganha umas 250 rupias por dia, ou US$ 5, mas é o suficiente para alimentar seus nove familiares, incluindo o filho, que perdeu recentemente o emprego de polidor de diamantes.

Patni e milhões de outras pessoas como ela integram a economia informal, um segmento gigantesco, vital e pouco compreendido do comércio mundial. E esse setor está ganhando importância agora que o colapso financeiro mundial elimina o ganha-pão de milhões de pessoas com empregos estáveis. Especialmente nos países em desenvolvimento, muitas dessas pessoas estão caindo no setor informal, que se tornou uma rede de segurança crucial diante da crise.

Há décadas que economistas enfatizam os aspectos negativos do mercado informal. Não se pagam impostos e faltam capital e conhecimento para obter a mesma produtividade de grandes empresas, o que gera menos inovação e pior padrão de vida. Já que os trabalhadores informais não contam com plano de saúde e outras proteções sociais, são obrigados a economizar mais para as emergências, o que resulta em menos consumo casual, diminuindo o impacto da atividade econômica. Ter um setor informal significativo "não é algo para se comemorar", diz Nancy Birdsall, economista do Centro para o Desenvolvimento Global, um centro de estudos em Washington. "Quando todos vendem maçãs uns para os outros, não se cria nova riqueza - é um indício de que as coisas não estão indo bem".

A crescente gravidade da atual recessão está forçando alguns analistas a reconsiderar essa visão. Até 52 milhões de pessoas podem perder o emprego no mundo por causa da crise, calcula a Organização Internacional do Trabalho, uma agência da ONU. Sem o setor informal, muita gente não terá para onde ir.

Os empregos informais "absorverão muita gente, oferecendo-as uma fonte de renda" no próximo ano, diz W.F. Maloney, economista do Banco Mundial em Washington. Essas ocupações inclusive "são um dos motivos pelos quais a situação nos países mais miseráveis não está tão ruim quanto você imagina", diz Simon Johnson, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional.

Até o fim de dezembro, Pilaporn Jaksurat, de 33 anos, trabalhava em tempo integral operando um tear numa indústria têxtil de Bangcoc. Ela ganhava cerca de US$ 7 por dia e entre seus benefícios havia bônus de US$ 30 por assiduidade e indenização de US$ 800 se perdesse o emprego.

Mas aí ela foi demitida da fábrica, que vende tecidos para fabricantes de roupa na Europa, então teve que cortar custos na esperança de sobreviver à crise econômica mundial. Encontrar um emprego parecido não era uma opção viável, já que as outras fábricas locais também estavam demitindo devido ao total declínio dos pedidos na Europa e América do Norte. Ela decidiu iniciar o próprio negócio, vendendo doses de vinho medicinal para caminhoneiros e motociclistas na estrada perto de sua casa. Com ajuda dos amigos, construiu uma barraquinha improvisada com bambu num gramado desocupado ao lado da estrada. O custo inicial foi de US$ 275, diz ela, pagos com dinheiro do pacote de rescisão.

Algumas semanas depois, gritando para se fazer ouvir no rugido dos caminhões em trânsito, Pilaporn disse que lucra uns US$ 10 por dia depois de subtrair as despesas com ingredientes como vinho e ervas. É melhor que os US$ 7 que ganhava por dia na fábrica de tecidos. Ela prefere ser o próprio chefe, diz, e a nova renda ainda permite continuar enviando dinheiro para seus pais e um filho de dois anos que moram na zona rural do norte da Tailândia.

Também há alguns trabalhadores informais nos países ricos, como empregadas, jardineiros e taxistas sem licença que não pagam impostos, embora o fenômeno não seja tão disseminado quanto no mundo em desenvolvimento. Os analistas dizem que a informalidade pode responder por até 10% da economia americana, e provavelmente esse porcentual esteja aumentando, agora que as empresas estão cortando vagas, o que força as pessoas a tentar a sorte com microempresas ou com trabalhos temporários em meio período.

No mundo em desenvolvimento, metade ou mais dos trabalhadores não-rurais está no setor informal, segundo a OIT. Na Índia, 83% dos trabalhadores são informais, enquanto na África Subsaariana são 72%.

O porcentual de trabalhadores informais, em certos momentos das últimas décadas, até aumentou em alguns países em desenvolvimento. Segundo a OIT, o setor informal correspondeu a uns 90% dos novos empregos criados na África durante a década de 90. No México, a participação do emprego informal aumentou em 1997 para 54% de todos os empregos, ante uns 50% em 1990. Venezuela e Brasil apresentaram crescimentos parecidos.

Alguns pesquisadores começam a argumentar que a economia informal está se tornando algo permanente em países mais pobres, à medida que o crescimento populacional ultrapassa a geração de empregos. A atual recessão, que vem pressionando as empresas a cortar custos com empregados, pode intensificar esse processo de levar as empresas a demitir caros trabalhadores formais e substituí-los por pessoas em meio período e sem benefícios. Muitos demitidos podem não conseguir nunca mais uma vaga na economia formal, enquanto as empresas se acostumam à flexibilidade dos temporários. (Colaboraram Wilawan Watcharasakwet e Vibhuti Agarwal)

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