sexta-feira, 20 de março de 2009

Redução e jornada e salário na Europa

Valor Econômico - Especial - 19.03.09 - A22

Trabalhador aceita salário e carga horária menores
Stanley Pignal, Financial Times
19/03/2009

Quando as vendas de aquecedores de alto padrão despencaram no fim de 2008, a situação apresentava-se sombria para os 300 funcionários da Jaga, uma empresa familiar na próspera região de Flandres, na Bélgica.

A empresa, contudo, temia dispensar mão-de-obra capacitada e acabar prejudicando suas chances de crescimento quando a economia melhorasse. "Temos uma linha complexa de produtos", diz o diretor de finanças Kris Custers. "Demora de um a dois anos antes que qualquer um realmente influencie em nosso lucro ou prejuízo."

Em vez de demitir 20% da força de trabalho, a firma convenceu os trabalhadores a abrir mão de 20% do salário em troca de redução similar na carga horária de trabalho. Alguns funcionários queixaram-se do corte salarial, mas apenas dois decidiram não se juntar ao esquema. O quadro pessoal brinca que será difícil voltar a trabalhar em horário normal quando os negócios se recuperarem.

"É melhor do que não ter emprego", diz a recepcionista, Allessandra Russano, que ficou com as quartas-feiras livres. "Se isso pode ajudar, não é o fim do mundo."

A fábrica da Jaga fica quase ociosa às sextas. A empresa economiza ? 40 mil por semana em salários. O esquema não é fácil de organizar, mas é uma questão de "bom senso", segundo Custers.

Os sindicatos apreciam as conversas sobre "solidariedade" e lembram-se dos cortes de até 40% em crises anteriores, quando quase todos os demitidos eram pessoas com funções braçais e salários mais baixos. "É algo necessário para a empresa e é por isso que dissemos sim à ideia", diz o representante sindical Ronald Verbaeken.

Os funcionários da Jaga estão entre os mais de 1 milhão na União Europeia (UE) que fazem parte de esquemas de redução horário laboral, parcialmente financiados pelo governo. Atualmente há cerca de 150 mil trabalhadores na Bélgica, 700 mil na Alemanha e 300 mil na França com menos horas de trabalho.

Os esquemas variam na Europa. Basicamente, os governos pagam benefícios por desemprego pelas horas que os funcionários deixam de trabalhar.

Alguns esquemas estão em vigor desde a Segunda Guerra Mundial e são vistos como uma forma, aprovada pelo tempo, de proteger empregos e permitir a flexibilidade das empresas.

Alguns países, como o Reino Unido, não apoiam a prática. O esquema pode ser dispendioso. A Eslovênia alocou orçamento de ? 230 milhões, 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), para seu primeiro programa do tipo.

A UE colocou de lado os receios de que os esquemas poderiam violar regras contra auxílio governamental e está oferecendo subsídios a empresas que oferecem treinamento de pessoal nos dias de "folga".

O presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, diz que alguns aspectos dos esquemas de redução de carga horária "poderiam ser considerados ajuda estatal em tempos normais", mas que "em casos extraordinários, é algo bom do ponto de vista social" e "bem melhor que o desemprego".

Algumas empresas, como a Jaga, foram além dos esquemas apoiados pelo governo, elaborados para proteger os trabalhadores com salários mais baixos. Estendeu a prática para o pessoal de colarinho branco (os funcionários gerenciais e administrativos), incluindo diretores seniores, e pediu-lhes que cogitassem corte salarial de 10% em troca de uma semana de quatro dias. O esquema não se qualifica para receber financiamento público, mas a Jaga diz que a economia com os dois esquemas incrementará o movimento de caixa anual em cerca de 5% e ajudará a gerar economias que de outra forma poderiam levar meses para se materializar.

John Monks, secretário-geral da Confederação Sindical Europeia, considera a ideia da redução de horas "extremamente interessante", mas teme que alguns países não compensem integralmente os funcionários pelas horas perdidas.

"Se há cortes de pagamento como resultado do esquema, isso pode ter um impacto na demanda na economia, o que é algo que sabemos que estendeu a Depressão [dos anos 30]", afirma.

Ernest-Antoine Seillière, chefe do grupo patronal Business Europe, diz que o menor número de horas trabalhadas está ajudando as empresas a reagir com flexibilidade à recessão sem perder capacitação humana, algo que poderia afetar a competitividade de longo prazo. "Haverá uma recuperação e é aí quando avaliaremos a competitividade em diferentes partes do mundo."

Nenhum comentário: