quarta-feira, 11 de março de 2009

Mudanças nas negociações coletivas

Jornal do Commercio - Gerência - 10.03.09 - B-18
Sindicalismo de resultados


VINICIUS MEDEIROS
DO JORNAL DO COMMERCIO



Depois de anos de conflitos, a relacão entre sindicatos e empresas vem se modificando nos últimos anos, num movimento marcado pela despolitização da atividade sindical e por mais maturidade das partes no momento da negociação. A consequencia tem sido a conquista de resultados mais rápidos e efetivos para os trabalhadores.

Seguindo uma tendência mundial, a ação sindical brasileira passou a visar negociações descentralizadas, considerando as condições econômicas de cada empresa. Em momentos de crise financeira, soluções mais ágeis, que permitam a manutenção do emprego, se tornam ainda mais necessárias. Setores que veem lideranças sindicais em clima de paz com empresários têm mais chances de evitar demissões em massa. Exemplos como o da Renault, que reconcovou 420 trabalhadores em sua fábrica em Curitiba, ilustram bem a tendência.

Segundo especialistas, a consolidação de boas relações entre as partes pode ser considerada como a principal responsável pela maior agilidade das negociações entre traba-lhadores e patrões. A busca por acordos empresa a empresa, em detrimento de diálogos setoriais, se tornou prática comum. "Trata-se de uma tendência mundial, porque as negociações descentralizadas são as únicas que permitem trocar, com mais precisão, produtividade por remuneração. O mesmo não pode ser feito em acordos setoriais e muito menos nacionais", afirma o sociólogo José Pastore, especialista em relações do trabalho e e ex-integrante do Conselho de Administração da Organização Internacional de Trabalho (OIT).

Magnus Apostólico, coordenador de Negociações Trabalhistas da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) acredita que a mudança da postura de ambos os lados está ajudando na melhora da relação entre patrões e empregados. "A busca por acordos diretos provoca uma negociação mais limpa. Ainda assim, devemos considerar que vivemos numa democracia jovem, em que o diálogo entre sindicatos e empresas é recente. As duas partes ainda precisam evoluir, mas estão no caminho certo", avalia.

Segundo Apostólico, negociações gerais ainda são vistas no mercado. "Em determinados setores, como bancário e petrolífero, o diálogo geral entre lideranças empresariais e sindicais são mais comuns. No entanto, a mudança no rumo dos acordos é visível. No Fórum Nacional do Trabalho, em 2003, discutiu-se a possibilidade de se buscar negociações empresa a empresa, mas nada foi para frente. No entanto, percebeu-se que havia essa tendência em setores em que os sindicatos são fortes", avalia.

Se de um lado os sindicatos foram para uma esfera micro na negociação com as empresas, o mesmo não aconteceu na definição de políticas públicas, pondera Pastore. "As centrais sindicais penetraram muito em todos os níveis do governo e estão influenciando muito as leis e normas administrativas que têm reflexos para as empresas e benefícios para os trabalhadores. Por exemplo: licença a gestante de 180 dias, salário mínimo de R$ 465, aposentadorias cada vez mais altas etc", afirma.

Já Apostólico ressalta que as negociações descentralizadas devem ser seguidas como regra em momentos de crise. "Os últimos anos nos mostraram que esse é o caminho. Ao mesmo tempo, deve-se sempre considerar as condições econômicas de cada companhia, pois, na crise, há grupos empresariais que negociam, reduzem jornada e não demitem ninguém, mas há outros que não podem negociar por conta do cenário nebuloso", acredita.

João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário geral da Força Sindical, também acredita que negociações descentralizadas são as ideais para momentos de crise. "Em crises, o diálogo é fundamental, até porque cada setor é afetado de uma maneira distinta. Cabe às centrais sindicais estarem atentas ao que acontece para dar uma resposta rápida ao trabalhador", avalia.



Setor automotivo. Segundo Juruna, o caso do setor automotivo brasileiro, em especial da fábrica da Renault, em Curitiba, é exemplar. Em janeiro, a montadora francesa dispensou cerca de 30% de sua força de trabalho, mas, após negociações com o sindicato local, que contou com auxílio da Força Sindical, cerca de 420 trabalhadores foram reconcovados. "Não foi um sucesso absoluto porque houve demissões, mas a presença do sindicato automotivo mostra como as coisas devem ser conduzidas. É claro que a recuperação nas vendas no início deste ano foi decisiva para o bom resultado, mas foi, sem dúvida, uma vitória. A Embraer, por exemplo, não quis negociar e foi parar no tribunal", afirma.

O sindicalista acredita que uma boa relação com sindicatos pode auxiliar empresas em dificuldades. "O empregador precisa entender que as lideranças sindicais não são bichos-papões. Um bom diálogo permite que eles percebam as condições da empresa e negociem melhor salários e acordos. Onde há conversa, a situação é boa", diz.

Magnus Apostólico corrobora as palavras de Juruna. "Diálogo sempre facilita muito, mas, ao mesmo tempo, não é algo que se constrói em situações de crise. Quem formou uma boa relação antes, certamente não está encontrando dificuldades para negociar. Considero o exemplo da Renault ilustrativo", acredita. Já Pastore tem ressalvas. "A boa relação pode ajudar desde que a legislação seja mais amigável. Enquanto for rígida, as negociações pouco valem, porque Ministério Publico e Justiça do Trabalho, por exemplo, podem anular tudo ou parte do que é negociado", diz.

Nenhum comentário: