quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

"Geração canguru" e o mercado de trabalho

Valor Econômico - Brasil - 02.01.2014 Geração "canguru" ajuda a manter desemprego baixo Por Camilla Veras Mota | De São Paulo De janeiro a novembro de 2013, de cada 100 novas pessoas em idade ativa nas seis maiores regiões metropolitanas do país, apenas 40 decidiram fazer parte do mercado de trabalho. Em 2012, 80 de cada 100 escolheram procurar emprego. Essa "nova realidade" do mercado de trabalho é a principal explicação para a manutenção da taxa de desemprego em mínimas históricas em 2013, mesmo diante do cenário de baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Os jovens são apontados por boa parte dos economistas como os principais responsáveis pelo crescimento abaixo das projeções da População Economicamente Ativa (PEA), dinâmica que tem tirado pressão do mercado de trabalho e, portanto, segurado a taxa de desemprego baixa. Com o aumento da renda familiar nos últimos anos, dizem, esse grupo tem conseguido adiar a busca pelo primeiro emprego ou tem voltado a estudar, apoiado financeiramente pelos parentes. A remuneração real por trabalhador, de acordo com os dados da Pesquisa Mensal do Emprego (PME), avançou a um ritmo de 2,8% por mês em 2011, em relação ao mesmo período de 2010, chegou a 4,1% em 2012 e, no ano passado, aumentou mensalmente cerca de 1,7%, na mesma comparação. . A evolução recente da taxa de participação, que mede quanto da População em Idade Ativa (PIA) está empregada ou em busca de emprego, reitera a teoria quando analisada por faixas etárias. Entre 2012 e 2013, o percentual de inserção daqueles com 18 a 24 anos no mercado de trabalho passou de média de 70% para 68%. A do grupo entre 15 e 17 anos retraiu no mesmo ritmo, foi de 20% para 18%. Nesse intervalo, a taxa de atividade só cresceu entre a população com idade de 25 a 49 anos, passando de 80% para 82%. Uma pesquisa recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) também reforça a tese com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2012. De acordo com o levantamento, entre 2002 e 2012, a proporção de jovens de 15 a 17 anos que trabalhava e estudava caiu de 23,1% para 18,8%, enquanto a dos que apenas estudavam cresceu de 58,4% para 65,4%. No período, o percentual de jovens entre 25 e 34 anos que ainda vivia com os pais aumentou de 20,5% para 24,3%. O crescimento da chamada "geração canguru", segundo o texto, pode também estar ligado à maior dedicação aos estudos. O grupo possui em média 10,8 anos de escolaridade, contra 9,6 anos entre o total dos jovens. A pesquisa joga luz ainda sobre outro possível motivo do avanço "preguiçoso" da PEA. Do total de jovens entre 15 e 29 anos, 19,6% nem estudava nem trabalhava. As mulheres formam 70,3% desse grupo - destas, 58,4% têm pelo menos um filho. "Não apenas os jovens, mas também as mulheres têm saído do mercado de trabalho para cuidar dos filhos. Este movimento é também derivado do aumento da renda das famílias", avalia Flavio Serrano, do BES Investimento. O comportamento atípico da PEA é tema de um estudo ainda não concluído de Miguel Pinho Bruno, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (ENCE), do IBGE. Ele defende que, além do aumento da renda, a dinâmica é influenciada por um esforço do governo para estimular a formação educacional e profissional. As 112,3 mil bolsas ofertadas pelo Programa Universidade para Todos (ProUni) em 2005, por exemplo, quando foi lançado, passaram para 252,4 mil em 2013. O Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), por sua vez, fechou 535,2 mil contratos até novembro do ano passado, contra 377,7 mil em 2012 e 154,2 mil no ano anterior. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) concedeu, no ano passado, 77,9 mil bolsas, patamar bastante superior às 23,4 mil registradas em 2002. Apesar de admitir que esta seja "uma política que parece justificar a si mesma", já que significa educar e capacitar mais um país que sofre com déficit de mão de obra qualificada, o especialista tem uma posição crítica em relação a ela. "Em um contexto marcado por taxas persistentemente baixas de crescimento econômico, elas são mais do que necessárias ou convenientes, acabam também sendo um modo eficaz de conter a corrida a um mercado de trabalho que não pode contar com uma economia dinâmica, já que o Brasil tem as menores taxas de crescimento econômico entre os BRICs e a América Latina", diz Pinho Bruno. Para ele, trata-se de uma política que tende, portanto, a dissuadir o jovem da busca, "não necessariamente precoce", de emprego. "O problema virá mais tarde quando esses jovens, uma vez formados, não conseguirem encontrar ocupação compatível com a qualificação ou a formação que adquiriram porque não há suficiente crescimento econômico", completa. Uma parte pequena das transformações que vêm ocorrendo na PEA, lembra o estatístico, decorrem de mudanças demográficas estruturais, como o envelhecimento da população e a cada vez menor disponibilidade de mão de obra jovem.

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