quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Efeito multiplicador do desemprego

Valor Econômico - Brasil - 26.02.09

O efeito multiplicador do desemprego
Denise Neumann


Pesquisas sobre o comportamento do mercado de trabalho em janeiro, divulgadas na semana passada, dão fortes pistas dos efeitos da crise sobre o mercado de trabalho. A Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrou que nas seis maiores regiões metropolitanas (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador e Porto Alegre) apenas na virada de dezembro para janeiro 323 mil pessoas ficaram sem emprego, um aumento de 20% no total de desocupados. Do total de novos desempregados, 73% são pessoas com 11 anos de estudo ou mais. Em outras palavras, de cada dez pessoas que passaram para a fila de desempregados, sete são pessoas mais qualificadas e, portanto, de maior renda!

Essa decomposição da taxa de desocupação é um dado extremamente preocupante, porque o efeito multiplicador negativo do aumento do desemprego entre esta parcela da população é mais devastador sobre o conjunto da economia do que quando o desemprego atinge trabalhadores com menor escolaridade e, portanto, com menor renda. Pela pesquisa do IBGE, o rendimento médio real de janeiro foi 2,2% maior que o de dezembro. Mais uma vez, no entanto, a abertura desse dado mostra que no setor privado a alta foi de apenas 0,4% e o setor público sustentou o aumento, com crescimento de 4%. E ainda mais: o rendimento médio real dos trabalhadores com carteira assinada caiu 0,95% no mês, confirmando que as demissões estão atingindo também os profissionais de maior salário.

O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), compilado mensalmente pelo Ministério do Trabalho, mostra que, desde o início da crise, já foram perdidos quase 800 mil postos de trabalho. Foi um ajuste muito rápido e muito concentrado na indústria. A indústria de transformação chegou a setembro do ano passado com aproximadamente 7,1 milhões de pessoas contratadas com carteira assinada, segundo dados do Caged. Depois, entre outubro e janeiro cortou 400 mil vagas, indicando que em apenas quatro meses o setor fez um ajuste de 5,6% no total da mão de obra empregada. Muita coisa! E o efeito multiplicador desse ajuste sobre os setores de serviços e comércio ainda virá. No conjunto da economia, o ajuste de emprego ainda foi bem menos intenso: 1,9% sobre o estoque de 38,8 milhões de empregos formais existentes até setembro do ano passado.

Esse ajuste no emprego ainda não é responsável pela forte queda na produção industrial - 9% no último trimestre do ano passado em relação ao terceiro trimestre. Aquele tombo foi motivado principalmente por uma atitude preventiva da indústria, que olhou para seu nível de estoques (até cinco meses de vendas no setor de distribuição de aço, por exemplo) e percebeu que era preciso por um pé no freio. Afinal, a demanda do passado (somados o consumo mundial e o interno) não seria mais a mesma por um bom número de meses.

A dúvida é onde vamos estacionar. Qual a demanda futura que vai determinar nível de produção e emprego na indústria? No trimestre encerrado em outubro de 2008, a indústria produziu 93% mais que em 2002 - maior patamar de produção já alcançado pela indústria brasileira segundo a série do IBGE, que tem 2002 justamente como base 100. No último trimestre do ano, esse nível caiu para 76% na mesma comparação. A recessão nos países da zona do euro e nos Estados Unidos - que juntos respondem por 37% da compra de produtos manufaturados produzidos no país - e também a perspectiva de retração na demanda interna (que virá em consequência do ajuste de emprego da própria indústria) indicam que algum novo ponto de equilíbrio deverá ser encontrado. E se for entre àqueles dois pontos, poderemos até ter boas notícias. Mas só torcer não será suficiente!

O equívoco do ministro Lupi

O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, anunciou que o Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) decidiu estender de cinco para sete parcelas mensais o seguro-desemprego. Importante medida, mas não com a equivocada regra de escolher os trabalhadores de alguns setores mais afetados pela crise a partir de um cálculo ainda a ser definido. Estes "privilegiados" do grupo especial terão direito às parcelas adicionais, enquanto os demais trabalhadores e suas famílias ficariam com as cinco parcelas normais, como se suas necessidades de sobrevivência fossem diferentes. Uma coisa é o governo definir setores que têm potencial para estimular o conjunto da economia (como a construção civil, a infraestrutura e mesmo a indústria automobilística). Outra coisa bem diferente é o governo segregar parte dos desempregados!

Denise Neumann é editora de Brasil
E-mail denise.neumann@valor.com.br

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