sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Aviso prévio de até 90 dias

Jornal Valor Econômico - 23.09.2011
Unânime na Câmara, aviso prévio maior divide reações
 

Por Fernando Exman e Juliano Basile | De Brasília
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Marco Maia: ação do presidente da Câmara possibilitou votação do projeto
Na busca por uma marca para sua passagem pela presidência da Câmara, o ex-líder sindicalista Marco Maia (PT-RS) decidiu, na noite de quarta-feira, em meio às conturbadas negociações sobre a criação da Comissão da Verdade, colocar em votação o projeto que aumenta o aviso prévio. A decisão contou com o apoio dos líderes de todos os partidos e foi aprovado por unanimidade em votação simbólica, mas já começa a provocar reações negativas de setores do empresariado e sindicatos. Há o risco, por exemplo, de a sanção do projeto provocar nova onda de processos na Justiça do Trabalho.

Atualmente, o aviso prévio é de 30 dias. Segundo o projeto, que seguiu à sanção presidencial, o trabalhador que tiver até um ano na mesma empresa terá 30 dias de aviso prévio. Depois, terá direito a mais três dias a cada ano trabalhado, não podendo ultrapassar 90 dias.

O projeto constava da agenda positiva debatida por Maia com líderes partidários. Outros dois fatores pesaram para a decisão de Maia. Em primeiro lugar, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Congresso estava se omitindo por não regulamentar o artigo da Constituição que trata do aviso prévio e poderia definir o assunto. Diante do risco de ver mais uma vez outro Poder legislar em seu lugar, a Câmara decidiu acelerar a tramitação da matéria.

Além disso, como as negociações entre a oposição e o Executivo sobre o projeto que cria a Comissão da Verdade estavam emperradas e o governo não queria deixar a sessão ser encerrada, Maia decidiu então colocar em votação o aviso prévio.

"Ele quer terminar este ano, que foi difícil politicamente, com a área legislativa se consolidando", comentou um líder governista. "Se ele soubesse que tinha todo aquele consenso [entre os partidos], tinha colocado para votar antes."

Maia iniciou sua carreira política no movimento sindical. Em 1984, tornou-se dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos de Canoas, no Rio Grande do Sul. Sob a condição do anonimato, o líder de um partido aliado diz que não será surpresa se Maia buscar atender nesta reta final de seu período na presidência outra antiga demanda dos trabalhadores: colocar em votação a proposta de emenda constitucional que prevê a expropriação da terra em que ficar comprovada a exploração de trabalho escravo. A matéria enfrenta resistências da bancada ruralista.

"À medida que o tempo foi passando, ele [Marco Maia] quis começar uma pauta positiva", explicou influente deputado petista. "A fórmula do projeto do aviso prévio teve um certo consenso e já estava madura para ser votada desde o Senado."

De fato, a proposta que eleva o aviso prévio não é nada nova no Congresso. Foi aprovada em 1989 pelo Senado com o objetivo de regulamentar um trecho da Constituição, promulgada um ano antes. No entanto, na sequência passou a tramitar a passos lentos nas comissões e desde 1995 estava pronto para ser votado pelo plenário da Casa.

A votação poderia ser adiada novamente na noite de quarta-feira não fosse Marco Maia. O presidente da Câmara convenceu os deputados Assis Melo (PCdoB-RS) e Jô Moraes (PCdoB-MG) a retirarem duas emendas que poderiam inviabilizar o acordo e fariam com que a matéria voltasse ao Senado. Os parlamentares queriam aumentar ainda mais o período de aviso prévio para reduzir a rotatividade nas empresas.

Apesar do consenso entre os líderes, o texto já começa a provocar polêmica. Líderes empresariais procuraram os parlamentares reclamando da votação. Sindicalistas também se dividiram. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) informou que a proposta está "aquém das expectativas". A Força Sindical comemorou (ver reportagens nesta página).

O Supremo vai ter que se reunir para decidir se as novas regras vão valer para quem foi demitido antes de a lei entrar em vigor. "Vamos ter que deliberar sobre os casos das pessoas que se sentiram prejudicadas e trouxeram o tema num mandado de injunção", afirmou o ministro Gilmar Mendes, referindo-se ao tipo de ação que foi utilizada por trabalhadores para levar o caso ao STF.

Antes da aprovação, todas as empresas aplicavam o prazo de 30 dias. O problema é que a Constituição deu esse prazo como mínimo e ainda estabeleceu que o aviso prévio deve ser proporcional ao tempo de serviço, mas, desde 1988, os parlamentares não definiam os critérios dessa proporcionalidade.

Mendes considerou positivo o fato de o Congresso ter, finalmente, aprovado lei sobre o tema. "Agora, o Congresso deliberou e ele tem a legitimidade democrática integral para fazê-lo", afirmou o ministro. "O nosso desejo sempre é que o Congresso faça", completou, referindo-se à necessidade de que o Congresso aprove normas previstas na Constituição de 1988.

Para empresários, medida traz custo, mas decisão da Câmara foi "mal menor"
Por Carlos Giffoni | De São Paulo
A aprovação na Câmara dos Deputados do aviso prévio proporcional e a perspectiva de que o aumento do benefício pode não ser retroativo aos trabalhadores demitidos no passado atendeu às demandas empresariais. Entidades da indústria, do comércio, de serviços e do setor financeiro temiam a intervenção do Supremo Tribunal Federal (STF), que não está descartada, e comemoraram a decisão do Legislativo. Os empresários avaliaram a extensão do aviso prévio como um "mal menor". A medida, dizem, vai aumentar o custo trabalhista, especialmente para as micro e pequenas empresas.

"Minha preocupação é que a rotatividade de empregados aumente nas pequenas empresas, pois elas não podem arcar com o pagamento de grandes quantias de uma só vez quando houver demissões", diz Magnus Apostólico, diretor de relações do trabalho da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban).

Para José Roberto Tadros, da Confederação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o fato do projeto não ser retroativo foi um alívio. "Se o STF decidisse sobre o assunto haveria margem para que trabalhadores demitidos nos últimos cinco anos reivindicassem a revisão do seu aviso prévio, o que quebraria as pequenas empresas do país".

Apesar do apoio da confederação do setor, a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FecomercioSP) se posicionou contra o aviso prévio proporcional, alegando que a medida vai desequilibrar as relações de trabalho e incentivar a informalidade. A Fecomercio vai pedir à presidente Dilma Roussef que vete o benefício.

Outra crítica feita pelos empresários foi a rapidez aplicada a uma discussão que estava parada no Congresso desde 1995. "O projeto deveria ter sido mais debatido. Haverá vários impasses, principalmente porque uma decisão trabalhista varia conforme o tamanho da empresa. Tratá-las [as empresas] como se fossem todas de grande porte não é bom para o país", diz Apostólico.

A maior preocupação dos empresários é o custo adicional que pode ser gerado. "Pelo menos, esse custo não será imediato, já que a medida não é retroativa, mas as empresas vão perder competitividade. O novo aviso prévio vai contra a diminuição da carga tributária", afirma Luigi Nese, presidente da Confederação Nacional de Serviços (CNS).

A Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) divulgou nota alertando que o pagamento do aviso prévio por parte das empresas será encarecido em 21%, o que deve representar aproximadamente R$ 1,9 bilhão adicional por ano. "Certamente vai aumentar um pouco o custo das empresas, mas aumenta a segurança. Da forma como estava, tinha uma insegurança com o tipo de indenização que as empresas tinham que dar para o trabalhador", ponderou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, que apoia o projeto aprovado. Para ele, a nova regra deve valer a partir do momento em que a proposta for sancionada. (Colaborou Fernando Exman, de Brasília)

Centrais preveem menos demissões e preparam ações por retroatividade
Por Raphael Di Cunto e Vandson Lima | De São Paulo
A aprovação do projeto de lei que instituiu o aviso prévio proporcional de até 90 dias dividiu opiniões entre as maiores centrais sindicais brasileiras. Enquanto a Central Única dos Trabalhadores (CUT) considerou a medida insuficiente, a Força Sindical, a União Geral dos Trabalhadores (UGT) e a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) avaliaram que o texto poderia ser melhorado, mas que já garante mais direitos aos trabalhadores.

"Os trabalhadores não estão com essa bola toda no Congresso Nacional. Se levássemos proposta mais radical a plenário, perderíamos", diz o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna. Vice-presidente da UGT, o deputado federal Roberto Santiago (PV-SP) concorda com a votação por consenso, mas faz uma ressalva. "A mesa diretora foi pressionada por líderes de partidos sem relação com os trabalhadores para votar um projeto que atendesse ao interesse dos patrões", afirmou.

Segundo o parlamentar, o Supremo Tribunal Federal (STF) discutia propostas de regulamentação mais radicais do que a aprovada pela Câmara, como o acréscimo de dez dias por ano de trabalho ou o pagamento de um salário a cada cinco anos no mesmo emprego. "A Câmara não fez nenhuma benevolência para os trabalhadores. Mas a regulamentação era esperada há muito tempo e vai diminuir a rotatividade no emprego", disse Santiago.

Para o presidente da CTB, Wagner Gomes, o projeto foi um pequeno avanço. A central defendia acréscimo de cinco dias por ano trabalhado, mas avalia que a mudança já garante mais direitos aos funcionários.

Por outro lado, o presidente da CUT, Artur Henrique, critica a abrangência da futura lei. "Os empresários estão reclamando do custo de esperar 90 dias para demitir, mas só uma minoria inexpressiva dos trabalhadores consegue ficar 20 anos em uma mesma empresa", afirmou, sobre o tempo necessário para atingir o teto do aviso prévio.

Na opinião de Henrique, a regulamentação foi boa, mas não impedirá a demissão dos funcionários para contratar outros por um salário menor. "A proposta aprovada no Congresso representa um custo muito pequeno para as empresas e não servirá para combater a rotatividade", observou o sindicalista.

De acordo com Gomes, da CTB, as centrais vão decidir se entrarão com ação para garantir a retroatividade do benefício - a Força Sindical já informou que orientará os trabalhadores demitidos antes da aprovação da nova regra a ingressarem na Justiça para cobrar o benefício. O prazo para entrar com reclamações trabalhistas é de dois anos.

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