O Globo - Economia - 28.06.2015 - pág. 37
Ministério do Trabalho perde estrutura e relevância
Com falta de fiscais, pasta fica de fora do debate sobre seguro-desemprego e emprego doméstico
RIO E BRASÍLIA - Criado em 1930 por Getúlio Vargas, o Ministério do Trabalho perdeu importância política, juntamente com funcionários e prédios. Atualmente, há 2.600 auditores fiscais — o menor número em 20 anos — e um déficit de mil vagas a preencher. As sedes das superintendências do Distrito Federal, de Sergipe, do Rio Grande do Norte, da Bahia, do Pará e do Acre estão interditadas por problemas de infiltrações, rachaduras e instalações elétricas precárias. No Pará, além de Belém, as unidades de Marabá e Santarém também estão fechadas.
Estas são as condições da pasta responsável pelas políticas de trabalho num país que tem mais de 95 milhões de ocupados e no qual cinco milhões sofrem acidente de trabalho em um ano. O ministério, nas mãos do PDT, esteve à margem da discussão sobre as medidas provisórias que restringiram o acesso ao seguro-desemprego e ao abono salarial, terceirização e regulamentação do emprego doméstico.
— Na sede do Acre, o teto caiu em cima de pessoas de um setor. No Rio Grande do Norte, uma parte do teto do setor de plantão caiu no ano passado. É uma situação de calamidade mesmo— afirmou a presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho, Rosa Campos Jorge.
— É preciso atender aos sistemas do seguro-desemprego, da carteira de trabalho, da Caixa (FGTS) e dos auditores. Quando todos funcionam ao mesmo tempo, o sistema cai. Há servidores no Rio Grande do Norte que fizeram uma vaquinha para contratar internet mais potente e poder trabalhar — afirma Rosa.
Quem atua diretamente com o ministério é unânime em constatar a perda de protagonismo da pasta, que já teve João Goulart e Jarbas Passarinho como ministros. A interlocução das centrais sindicais tem sido com a Casa Civil ou com a Secretaria-Geral da Presidência.
— O movimento sindical está vendo esse esvaziamento político há algum tempo. Os concursos demoram a acontecer e não há participação nas decisões políticas. Um ministério que era tão importante quanto o da Fazenda... É preocupante a pouca atenção que está sendo dada ao ministério — afirma Miguel Torres, presidente da Força Sindical.
A falta de pessoal não é só na fiscalização. Das 424 agências do ministério no país, 50 estão fechadas por falta de pessoal. Das metas fixados pelo ministério, as de combate ao trabalho escravo e contra a informalidade não foram alcançadas.
— Eram nove grupos móveis de trabalho escravo, agora são só quatro. Não há fiscalização sem fiscais. O último concurso foi feito em 2013 para cem fiscais e não supriu nem as vagas deixadas por quem se aposentou. E temos 500 auditores prontos para se aposentar — reclama Rosa.
GASOLINA SAI DO BOLSO DO FISCAL
O delegado sindical Jucelino Garças, que fica em Porto Velho, trabalha em salas emprestadas pelo Ministério Público do Trabalho. A sede da superintendência está interditada. São 37 fiscais para dar conta de grandes obras na região. Já morreram 35 trabalhadores desde 2010, segundo a superintendência, em projetos que reuniram cerca de 40 mil trabalhadores no ápice:
— Quando chegamos o acidente já aconteceu.
A unidade de Pelotas foi interditada há dois anos.
— Para fiscalizar empresas, fundições, canteiros de obras de grande porte, usamos carro próprio. Recebemos R$ 17 por dia pelo uso do carro como um aluguel, a gasolina é por nossa conta — afirma o auditor fiscal Luiz Alfredo Scienza, engenheiro de segurança no Rio Grande do Sul.
Na área de segurança e saúde, há 340 fiscais, apenas 13% do quadro. No Brasil, mais de 15 mil pessoas adoeceram trabalhando em 2013. O sindicato já fez duas denúncias à Organização Internacional do Trabalho (OIT) pela sucateamento da estrutura de fiscalização no ano passado.
— Há uma desestruturação do quadro de auditores. O papel do auditor fiscal também é o de orientar. Quanto menos isso ocorre, mais a quantidade de descumprimento da legislação se potencializa.
O esvaziamento do Ministério do Trabalho começou em meados da última década. Segundo fontes da Esplanada, na gestão da presidente Dilma Rousseff, houve ação deliberada do Planalto em reduzir a importância política da pasta, que teve as atribuições restritas à divulgação dos dados do emprego formal (Caged) e da concessão de registros sindicais.
Ministério nega esvaziamento: há R$ 440 milhões para obras
Secretário-executivo da pasta do Trabalho reconhece falta de fiscais
BRASÍLIA - O Ministério do Trabalho negou que a pasta venha perdendo importância política e recursos. Por meio de nota, diz que a “Casa Civil da Presidência da República autorizou este ano a liberação de R$ 440 milhões para modernização da estrutura do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e dos postos do Sistema Público de Emprego (Sine), além de outras melhorias".
O secretário-executivo do Ministério, Francisco José Pontes Ibiapina, reconheceu a falta de pessoal e estrutura. Ele disse ao GLOBO que das 424 agências regionais, 50 estão fechadas por falta de pessoal (funcionários concursados). Ele também admitiu que a área de fiscalização sofre com a falta de auditores fiscais, o que reduz o número de operações nas missões de combate ao trabalho escravo e infantil.
Apesar disso, ele observou que serviços prestados nas unidades do ministério estão regulares e que não pode se responsabilizar pelos postos administrados por estados e prefeituras. Neste caso, os agentes públicos apresentam um plano de trabalho ao Ministério, que repassa recursos via convênio para assegurar o funcionamento das unidades.
O secretário rebateu a crítica de que a pasta perdeu o protagonismo, principalmente na área da fiscalização. Ele disse também que aguarda autorização do Ministério do Planejamento para contratar 847 auditores concursados:
— Somos protagonistas na área de fiscalização, apesar da redução do quadro de auditores fiscais.
Em nota, o ministério diz que vem aumentando o número de empresas fiscalizadas com o mesmo número de fiscais. “A expectativa é que as notificações e autos de infração lavrados, que somaram R$ 2,3 bilhões no ano passado, possam triplicar com o novo sistema”.
Ibiapina afirmou que o ministério não está sendo deixado de lado nas grandes discussões na área trabalhista. Disse que a pasta estará presente no fórum criado pela presidente Dilma Rousseff, com a participação das centrais sindicais, para tratar, por exemplo, de um sistema alternativo às demissões, com redução de jornada e de salários.
Na nota, o ministério diz que a “previsão é que as obras atinjam 2.200 postos do ministério e do Sine em todo país”. O texto destaca ainda que a emissão de carteira de trabalho digital, “via sistema on-line” já funciona em Rio de Janeiro, Ceará, Pernambuco, Distrito Federal e deve estar em todo o país até o fim do ano.
Sobre a fiscalização, o ministério afirmou que 1.674 trabalhadores foram resgatados do trabalho análogo a de escravo.
No que tange à qualificação, o ministério afirma que “estará implementando, a partir desse ano, a Universidade do Trabalhador. Esse projeto de qualificação à distância tem como prioridade os beneficiários do seguro-desemprego cadastrados nos postos de intermediação de mão de obra”.

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