terça-feira, 30 de agosto de 2016

Negociação coletiva sem participação do sindicato laboral

Valor Econômico - Legislação & Tributos - 29/08/2016 ­- E1

Empregados e companhias podem negociar sem sindicatos 
Por Adriana Aguiar 

Empresas e funcionários podem negociar diretamente condições de trabalho, caso o sindicato da categoria se negue a seguir com a negociação. A decisão é da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SBDI­1) do Tribunal Superior do Trabalho (TST), última instância da Justiça do Trabalho. O julgamento é o primeiro a tratar do tema na SDI­1, segundo advogados da área, e servirá de precedente às companhias. Para advogados de sindicatos, porém, a novidade pode oferecer riscos aos trabalhadores que podem ser induzidos a fechar acordos desfavoráveis. A possibilidade, entretanto, só será admitida se preencher certos requisitos como a prova cabal da recusa do sindicato e a procura da federação e confederação correspondente para a resolução do impasse. O caso julgado envolve a Braskem e o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Química e Petroquímica de Triunfo (RS). A empresa fez um acordo com os empregados, englobando o período de maio de 1997 a maio de 1999, que instituiu turnos ininterruptos de 12 horas de jornada. O artigo 617 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) admite a possibilidade de negociação direta entre empresas e trabalhadores. Os ministros, porém, precisaram avaliar se o dispositivo foi admitido pela Constituição Federal de 1988. Isso porque, o inciso XIV do artigo 7º da Constituição estabelece a jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva. E o inciso VI, do artigo 8º da CLT diz que é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas. E por maioria, os ministros decidiram que o artigo 617 da CLT está em vigor. Diante da possibilidade de negociação direta, os ministros decidiram pelo retorno do processo para apreciação do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT do Rio Grande do Sul). A Corte havia definido que não poderia ser admitido o acordo direto porque não seria válido o artigo 617 da CLT. Com o uso do dispositivo reconhecido pelo TST, o TRT­RS terá que analisar se estão presentes os requisitos para se admitir a negociação direta no caso concreto. O advogado que assessorou a Braskem, Victor Russomano Júnior, do Russomano Advocacia, afirma que a discussão ainda não tinha sido enfrentada pela SDI­1 e que a decisão uniformiza a jurisprudência do TST no sentido de ser possível a negociação sem intermediação do sindicato dos trabalhadores, quando há a recusa da entidade. "Ficou claro que o artigo 617 da CLT permanece em vigência com a Constituição". Representante do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Química e Petroquímica de Triunfo no processo, o advogado Marthius Sávio Cavalcante Lobato, do Lobato Advocacia e Consultoria Jurídica, avalia o julgado como um precedente perigoso para os trabalhadores, que podem ficar desamparados na negociação. Segundo ele, é comum empresas que não chegam a um acordo com o sindicato, usar seu poder de mando para obter via abaixo­assinados o conteúdo dos acordos que desejam. "Nestes sempre ocorre a redução de direitos", afirma. O advogado acrescenta que o Supremo Tribunal Federal (STF), quando analisou a Lei da Participação de Lucros e Resultados (PLR), julgou inconstitucional a possibilidade de acordo direto com a comissão de empregados. Sobre o caso concreto, o advogado ressalta que não houve recusa a negociar, mas não se chegou a um acordo de aumento da jornada para 12 horas. "Diante disso, a empresa simplesmente passou uma lista interna que foi assinada por alguns trabalhadores que tinham interesse", afirma. Para Lobato, a companhia também não cumpriu os requisitos do artigo 617 porque sequer procurou a federação e a confederação para tentar negociar. O julgamento ocorreu no TST em maio, mas a decisão ainda não foi publicada. O relator ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho foi vencido, por entender que o artigo 617 da CLT não teria validade após a vigência da Constituição de 1988. Ele foi acompanhado pelos ministros Augusto César Leite de Carvalho, José Roberto Freire Pimenta e Hugo Carlos Scheuermann. O acórdão será redigido pelo ministro que teve seu voto vencedor, João Oreste Dalazen. Os ministros Renato de Lacerda Paiva e Aloysio Corrêa da Veiga não participaram do julgamento, em razão de impedimento. A advogada Juliana Bracks, do Bracks Advogados Associados, afirma que "a iniciativa de se negociar diretamente com empregados, quando o sindicato se recusa terminantemente, é ótima e tem previsão na CLT". Porém, ressalta que há um risco já que essa negociação seria válida apenas para empregados. A União, portanto, poderia cobrar os valores do INSS e Imposto de Renda (IR) das verbas negociadas, já que ela não é signatária do acordo. "Para ter segurança em acordos sem o sindicato, só se o Judiciário estender a validade não apenas para as partes signatárias mas também os efeitos reflexos de terceiros", diz.

Acordo com a Mercedes troca reposição salarial por demissão incentivada no valor de R$ 100 mil

Valor Econômico - Empresas - 25/08/2016 ­- B5

Mercedes retira reajuste salarial em 2017 
Por Marli Olmos

A Mercedes­Benz fechou ontem um acordo com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC que oferece R$ 100 mil a qualquer funcionário que aceitar sair da empresa. A oferta vale por uma semana e a meta é obter a adesão de 1,4 mil trabalhadores, o que equivale a aproximadamente 15% do efetivo. Para evitar cortes, a empresa ofereceu um programa atrativo de demissão voluntária e a promessa de manter jornadas reduzidas para "driblar" o excesso de pessoal que ainda vai sobrar. Em troca, o trabalhador que ficar na empresa não terá nenhuma reposição da inflação no salário do próximo ano. Se de um lado a negociação entre uma gigante do setor automotivo e um dos sindicatos mais combativos do país pode ter poupado muitos de perder o emprego por outro abre um precedente. "Um acordo sem nenhuma reposição inflacionária entre uma empresa do porte da Mercedes e um sindicato como o dos metalúrgicos do ABC terá efeito nas negociações que vêm por aí", diz o professor da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (FEA­USP), Hélio Zylberstajn. Coordenador do boletim "Salariômetro", da Fipe, Zylberstajn lembra que categorias importantes como bancários, químicos funcionários da Petrobras e outros metalúrgicos estão em véspera de negociação salarial. Em 2015, a Mercedes acertou com os empregados reajuste de 50% do INPC em 2016 e de 100% do índice de inflação em 2017. No acordo celebrado ontem foi retirada a cláusula do INPC integral no próximo ano. No lugar, os empregados aceitaram abono de R$ 4 mil, a ser pago em maio, data­base na Mercedes. Segundo Zylberstajn, tentar compensar a perda da reposição da inflação com um abono tem sido cada vez mais comum. Os representantes do sindicato consideram, porém, ter fechado um bom acordo não só por evitar demissões como pela garantia de estabilidade no emprego até dezembro de 2017. Essa foi uma das principais cláusulas do acordo aprovado em assembleia ontem de manhã na porta da fábrica de São Bernardo do Campo (SP), onde são produzidos caminhões e ônibus. "Abrimos mão do INPC, mas teremos um ano em paz", diz Moisés Selerges, diretor do sindicato e funcionário da Mercedes. Mesmo que a meta do PDV seja atingida ainda restarão 1,2 mil excedentes, segundo anunciado pela empresa, que se comprometeu a contornar o excesso de pessoal por meio de ferramentas como "layoff". Para o professor da FEA, não havia mesmo muita margem para negociar melhor. Segundo dados da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), o volume de vendas de caminhões no Brasil caiu 30,9% de janeiro a julho e a ociosidade nessa indústria chega a 75%. Empresa e sindicato acreditam em rápida adesão de voluntários ao PDV, que vai até quarta­feira. A gratificação de R$ 100 mil vale para qualquer setor e independe do tempo de casa, o que, segundo Selerges, diferencia a oferta em, relação à maioria dos PDVs. Segundo o sindicalista, em torno de 60% do efetivo da Mercedes têm até 12 anos de casa. Para ele, a proposta vai atrair "duas pontas": "a moçada, que tem uma carreira pela frente e os que estão prestes a se aposentar". No setor de produção da empresa, o salário médio mensal gira em torno de RS$ 4,5 mil. A indústria automotiva opera com excesso de pessoal desde o ano passado. No início do mês, a Mercedes anunciou que tinha 2,67 mil empregados a mais no ABC e que já havia esgotado todas as formas de contornar o problema, por meio do Programa de Proteção ao Emprego (PPE) e suspensão temporária do trabalho. No dia que anunciou o tamanho do excedente, a empresa concedeu licença remunerada a todo o efetivo, mas muitos trabalhadores voltaram para a fábrica para participar de protestos e passeatas.